O uso de pílula anticoncepcional levanta debates e traz dúvidas relacionadas à saúde da mulher. Usada para questões hormonais, controle de fertilidade ou problemas de saúde específicos, a pílula foi um item inovador lançado da década de 1960, mas hoje sofre pressão para que seja deixado de lado pelas mulheres. Mas, afinal, é seguro usar o remédio? Médicas de Santa Catarina explicam o assunto.
Antes de sentenciar sobre o uso do método, vale entender em quais casos ele deve ser utilizado. Apesar de figurar como o contraceptivo mais utilizado pelas brasileiras, cerca de 58% – segundo pesquisa de 2021 publicada pelo Instituto Ipsos, umas das maiores empresas de pesquisa do mundo – ele pode, em alguns casos, ser substituído por opções naturais.
“Muitas pessoas buscam o anticoncepcional como contraceptivo e para tratar questões de saúde por falta de informação adequada juntos aos seus profissionais de saúde. Há maneiras de cuidar de si que estão relacionadas a estilo de vida e condições financeiras. É possível cuidar com alguns [tratamentos] fitoterápicos. Por exemplo, a cólica menstrual pode ser abordada com estilo de vida e fisioterapia”, revela a ginecologista Halana Faria.
Não há números que mostrem o número de usuárias da pílula em Santa Catarina, mas, segundo a pesquisa publicada, os outros contraceptivos, como a chamada camisinha, aparece em segundo lugar, com 43% das 450 brasileiras ouvidas de todas as regiões.
Somente 13% das mulheres disseram não fazer uso de nenhum produto para fins contraceptivos, afirmando ter domínio do planejamento reprodutivo. O DIU de cobre ficou em terceiro lugar, com 8%, e a injeção mensal em último, com 6%.
Leque de opções
“Métodos hormonais devem fazer parte de um leque de opções com relação à contracepção, mas, hegemônica e historicamente, se usa como se fosse a única opção. As pessoas se ressentem, hoje em dia, por irem a consultórios médicos e receberem como única opção os métodos hormonais”, conclui Faria.
Como se a falta de informações já não fosse um problema por si só, a médica explica que o comportamento pode afetar outras situações. “Muitas das questões de saúde, seja síndrome dos ovários policísticos ou endometriose, não são abordados de forma mais integral, e aí se prescrevem métodos hormonais, não necessariamente para contracepção, mas para tratamento de saúde”.
“A pílula também pode ser indicada para algumas situações de síndrome dos ovários policísticos, para diminuir o sangramento excessivo, mas não como tratamento, pois é uma síndrome metabólica. A pílula pode até piorar essa síndrome metabólica, então precisa orientar as pessoas a resolverem, de verdade, esse problema”.
A ginecologista reforça que pode haver benefícios, sim, no uso da pílula, mas vale ficar de olho nos efeitos e nas consequências de um uso sem acompanhamento médico.
“Pode haver, sim, melhoria da pele, de alguns sintomas de sangramento excessivo, cólica menstrual, mas temos que pensar também nas questões que falam sobre uma associação do uso de pílula com o aumento de chances de câncer de mama, de uso de antidepressivo em jovens… há um aumento de doenças do fígado, diabetes e câncer de colo de útero. Sempre que prescrevemos a pílula, precisamos levar em conta os possíveis efeitos colaterais”.
Na contramão
No entanto, não é necessário ‘culpar’ o uso da pílula anticoncepcional. Com diversos formatos disponíveis para serem usados, o comprimido é oferecido de forma ininterrupta ou intercalada, com pausa de alguns dias para a menstruação.
“Para cada paciente se escolhe a melhor forma de tomar [o remédio]. A ação dele não apenas inibe a ovulação, mas também altera o muco cervical e a mobilidade da trompa”, conta a médica ginecologista Ana Rosa.
Ele ainda pode servir como agente no combate às dores causadas pelo ciclo menstrual. “Pode melhorar sintomas de TPM, dor na mama, irritabilidade, ou sintoma de endometriose, anemia por causa da perda de sangue, ajuda também em casos de cisto de ovário, e reduz câncer de ovário, endométrio e intestino”, aponta.
No entanto, a indicação para ingerir os comprimidos precisa passar por uma avaliação de histórico de cada paciente, conforme explica Rosa. “Precisa saber se já teve trombose ou embolia pulmonar, histórico de trombofilia, se fará cirurgia, se tem lúpus, se é fumante, obesa, a idade… há várias considerações a se avaliar antes de indicar o uso”.
Entre os relatos de efeitos colaterais, alguns são mais comuns em consultórios. “Algumas pacientes relatam alterações de humor e ganho de peso quando usam anticoncepcional. Com relação à alteração do humor, há um dado que afirma que uma em cada mil mulheres apresenta necessidade de uso de antidepressivo. Já a retenção de líquido é temporária, o corpo tende a voltar ao peso normal”.
“Outra queixa muito comum é a queda de libido. Por isso, muitas mulheres estão parando com o método hormonal e observando mais o corpo. Algumas mulheres que logo que usaram a pílula logo que começaram a menstruar nem conhecem seu ciclo. Atualmente, existe uma tendência a interromper o uso, a conhecer o corpo”, diz a médica.
Responsabilidades impostas
Historicamente ligada à mulher, a responsabilidade por uma gestação começa, nos tempos atuais, a ganhar novos protagonistas. Após o surgimento de pesquisas e protótipos de pílulas masculinas, as mulheres aproveitam para entender que o uso do anticoncepcional, ainda que possua eficácia no combate à gravidez indesejada, pode não ser apenas responsabilidades delas.
Conforme um estudo realizado por uma equipe de cientistas, liderada por Abdullah Al Noman e Gunda Georg, nos Estados Unidos, o contraceptivo masculino apresentou 99% de eficácia em testes feitos em roedores e, agora, o medicamento passará por testes em humanos, podendo chegar ao mercado em menos de cinco anos, segundo informações do Portal UOL.
Com relação ao uso dos remédios femininos, os contornos sociais ainda pesam. “Existe uma enorme desigualdade com relação à reprodução. Precisamos trazer este debate à tona. Em consultório, vejo mulheres que já gestaram, estão em relações estáveis e ainda são elas que precisam se preocupar se vão colocar o DIU, se farão laqueadura ou passarão a usar método hormonal”, pondera Halana.
Por fim, ela faz um alerta. “A pílula, depois dos 40 anos, precisa ser muito bem pensada, pois há aumento de risco cardiovascular, mas [as mulheres] nem consideram que os parceiros poderiam pensar numa vasectomia”.