
“Eu me senti um nada, um lixo, um zé ninguém para eles, como se eu fosse um animal. Não tinha necessidade daquilo”. A costureira Silvana de Souza carrega na perna as marcas das fraturas na fíbula e na tíbia, da cirurgia e dos 13 pinos que precisaram ser colocados depois que a perna quebrou quando ela foi agredida por um policial militar em uma ação que aconteceu em Mafra, no Planalto Norte catarinense.
A ação aconteceu ainda no dia 19 de fevereiro, mas o vídeo que mostra o momento que ela é derrubada e imediatamente machucada viralizou nesta terça-feira (10). A própria irmã, Tatiana de Souza, foi quem gravou a ação policial.
Silvana conta que estava em casa, com a mãe, quando viu a movimentação policial. Quando saiu para saber o que estava acontecendo, já teria visto os sobrinhos, a irmã e o cunhado com os olhos vermelhos, efeito do gás lacrimogêneo.
“Eu já fui abordada por um policial com spray de pimenta. Comecei a discutir com um policial porque achei abuso de autoridade. A ocorrência não tinha nada a ver conosco e já entraram no nosso terreno com violência, com arma apontando pra todo mundo, com spray”, lembra.
A costureira garante que, em momento algum, houve agressão ou ameaça dos moradores com os policiais, mas admite que xingamentos foram direcionados a eles por conta da brutalidade da ação.
“Ninguém estava agredindo, ameaçando, mas xinguei quando vi o que estavam fazendo. O policial me prendeu por desacato e em nenhum momento eu disse que não iria. Quando ele me tirou do terreno para levar na viatura que estava mais próxima, me deu uma rasteira”, lembra.
Neste momento, a irmã já estava gravando a ação e o vídeo flagra o momento que Silvana é jogada no chão com violência. Imediatamente o rosto começa a sangrar e, na parte, a fratura fica visível.
“Eu nem lembro o que ele me falou, dei uma pancada no chão e acho que ele nem tinha visto que tinha quebrado minha perna. Eu tentei levantar e não consegui, foi aí que gritei: ele quebrou minha perna”, conta.
A irmã de Silvana até tenta socorrê-la, mas também é derrubada e a gravação encerra. Tatiana contou que o celular foi levado pelos policiais e devolvido apenas oito dias depois.
A costureira lembra ainda que, depois de ser jogada no chão, permaneceu ali, na frente de casa, com a perna fraturada e o rosto sangrando por aproximadamente uma hora até que os bombeiros chegassem para prestar atendimento.
Aos bombeiros, conta Silvana, o policial afirmou que ela “tropeçou” e que ele havia se desequilibrado e caído em cima dela, o que teria provocado a fratura.
“Eles [policiais] não prestaram atendimento nenhum. Quando os bombeiros chegaram, o policial falou que eu caí sozinha, que reagi a prisão e caí sozinha e que com o material de trabalho dele, veio a fratura na perna”, diz.
O mesmo policial, afirma ela, foi o responsável por ouvir seu depoimento no hospital para o registro da ocorrência. Dois dias e meio depois e após a cirurgia, que rendeu alguns pontos e 13 pinos, ela foi liberada e só conseguiu ir para casa porque a irmã pagou a fiança exigida pela polícia.
A costureira conta ainda que no próximo dia 25 de março tem retorno médico e a necessidade de uma nova cirurgia deve ser avaliada. Um raio x apontou um desligamento de tendão e ela pode ter que passar por novo procedimento cirúrgico.
“É uma situação complicada, era uma coisa que não tinha nada a ver com a gente e eles falando como se nós fôssemos bandidos. É constrangedor, não posso trabalhar e tenho filhos para sustentar. Me sinto ameaçada porque, querendo ou não, eles têm poder. Eu espero que a justiça seja feita, que os policiais sejam punidos, que paguem pelo que fizeram. Foi negligência de ambas as partes, um pouco minha, que me excedi, xinguei, mas eles não precisavam fazer isso”, lamenta.
A família contratou advogados que informaram, por nota, que aguardam os trabalhos do Ministério Público e do comando da PMSC para “entrar com as medidas judiciais cabíveis”.