Machismo na ciência: 90% das pesquisadoras afirmam ter sofrido preconceito em razão de seu gênero

Não é novidade que o mercado de trabalho pode ser um espaço desafiador para as mulheres. O ambiente, que há séculos era dominado pelo gênero masculino, teve de ser conquistado, mas ainda apresenta uma série de dificuldades e desigualdades, como disparidade salarial, menores oportunidades, descrédito e assédio.

Na carreira científica o cenário não é diferente. Sexismo disfarçado de conselho e ofensas ditas em tom de brincadeira são algumas das situações relatadas por um grupo de mulheres cientistas que, no auge de sua carreira, ainda se encontram em situações alvo de machismo e preconceito, mesmo que em um ambiente com alto nível de instrução e educação. A premiação do Nobel deste ano chamou atenção para este fato quando, em uma mesma edição do prêmio, três dos contemplados na área de ciência terem sido pesquisadoras mulheres. Em 120 anos do prêmio, com mais de 600 premiados em ciência, menos de 4% eram do gênero feminino.

Uma mulher no topo da carreira científica é uma raridade, e mesmo nessa posição de privilégio, o machismo não deixa de atingi-las, principalmente no Brasil, conforme relatam as pesquisadoras brasileiras que tiveram seu trabalho reconhecido no Prêmio para Mulheres na Ciência L’Oréal / Unesco / Academia Brasileira de Ciências (ABC). Para comemorar os 15 anos que completam esta iniciativa, os organizadores decidiram ouvir essas cientistas e traçar um panorama sobre o que foi vivido ao longo destes anos pela perspectiva feminina, a fim de observar e refletir sobre o que pode ser melhorado para incentivar e melhorar a prática da ciência feminina.

Segundo o levantamento feito pelo Estadão, 90% destas cientistas afirmam já terem vivenciado alguma situação de preconceito ou discriminação em razão do seu gênero. Neste levantamento, foram entrevistadas 70 mulheres, das 96 premiadas até o ano passado, onde elas relataram situações incômodas durante o dia a dia, como comentários inoportunos, brincadeiras ou insinuações machistas.

Na pesquisa, 74% delas afirmaram que tiveram que mudar seu comportamento para serem levadas à sério por colegas de trabalho. Na maior parte dos casos, segundo uma das entrevistadas, o preconceito é velado, com o desrespeito aparecendo apenas nas entrelinhas. Outro número assustador é que, ao menos, 70% já foi vítima ou presenciou alguma situação de abuso ou assédio sexual, de forma física ou verbal. Destas, apenas uma em cada quatro cientistas considera que a administração de seus ambientes de trabalho acreditou na veracidade das denúncias de tais situações.