Ficam penduradas em paus-de-arara e, depois, saem felizes com apenas um canteirinho de cabelos, como um jardinzinho estreito, a vereda indicativa de um desejo inofensivo e n\u00e3o mais as agressivas florestas que podem nos assustar. Parecem uns bigodinhos verticais que (oh, c\u00e9us!\u2026) me fazem pensar em\u2026 Hitler.<\/p>\n

Silicone, p\u00ealos dourados, bumbuns malhados, tudo para agradar aos consumidores do mercado sexual. Olho as revistas povoadas de mulheres lindas\u2026 e sinto uma leve depress\u00e3o, me sinto mais s\u00f3, diante de tanta oferta imposs\u00edvel.<\/p>\n

Vejo que no Brasil o feminismo se vulgarizou numa liberdade de \u201cobjetos\u201d, produziu mulheres livres como coisas, livres como produtos perfeitos para o prazer.<\/p>\n

A concorr\u00eancia \u00e9 grande para um mercado com poucos consumidores, pois h\u00e1 muito mais mulher que homens na pra\u00e7a (e-mails indignados vir\u00e3o\u2026) Talvez este artigo seja moralista, talvez as uvas da inveja estejam verdes, mas eu olho as revistas de mulher nua e s\u00f3 vejo paisagens; n\u00e3o vejo pessoas com defeitos, medos.<\/p>\n

S\u00f3 vejo meninas oferecendo a do\u00e7ura total, todas competindo no mercado, em contor\u00e7\u00f5es er\u00f3ticas desesperadas porque n\u00e3o t\u00eam mais o que mostrar. Nunca as mulheres foram t\u00e3o nuas no Brasil; j\u00e1 expuseram o corpo todo, mucosas, vagina, \u00e2nus.<\/p>\n

O que falta? \u00d3rg\u00e3os internos? Que querem essas mulheres? Querem acabar com nossos lares? Querem nos humilhar com sua beleza inconquist\u00e1vel? Muitas t\u00eam boquinhas t\u00edmidas, algumas sugerem um susto de virgens, outras fazem cara de zangadas, ferozes gatas, mas todas nos olham dentro dos olhos como se dissessem: \u201cVenham\u2026 eu estou sempre pronta, sempre alegre, sempre excitada, eu independo de car\u00edcias, de romance!\u2026\u201d<\/p>\n

Sugerem uma mistura de menina com vampira, de do\u00e7ura com loucura e todas ostentam uma falsa tes\u00e3o devoradora. Elas querem dinheiro, claro, marido, lugar social, respeito, mas posam como imaginam que os homens as querem.<\/p>\n

Ostentam um desejo que n\u00e3o t\u00eam e posam como se fossem apenas corpos sem vida interior, de modo a n\u00e3o incomodar com chatea\u00e7\u00f5es os homens que as consomem.<\/p>\n

A pessoa delas n\u00e3o tem mais um corpo; o corpo \u00e9 que tem uma pessoa, fr\u00e1gil, t\u00eanue, morando dentro dele.<\/p>\n

Mas, que nos prometem essas mulheres virtuais? Um orgasmo infinito? Elas figuram ser odaliscas de um para\u00edso de mercado, \u00faltimo andar de uma torre que os homens atingiriam depois de suas Ferraris, seus Armanis, ouros e sucesso; elas s\u00e3o o coroamento de um narcisismo yuppie, s\u00e3o as 11 mil virgens de um para\u00edso para executivos. E o problema continua: como abordar mulheres que parecem paisagens?<\/p>\n

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Outro dia vi a modelo Daniela Cicarelli na TV. Voc\u00eas j\u00e1 viram essa mo\u00e7a? \u00c9 a coisa mais linda do mundo, tem uma esfuziante simpatia, risonha, democr\u00e1tica, perfeita, a imensa boca r\u00f3sea, os \u201colhos de esmeralda nadando em leite\u201d (quem escreveu isso?), cabelos de ouro seco, seios b\u00edblicos, como uma imensa flor de prazeres.<\/p>\n

Olho-a de minha solid\u00e3o e me pergunto: \u201cOnde est\u00e1 a Daniela no meio desses tesouros perfeitos? Onde est\u00e1 ela?\u201d Ela deve ficar perplexa diante da pr\u00f3pria beleza, aprisionada em seu destino de sedutora, talvez at\u00e9 com um vago ci\u00fame de seu pr\u00f3prio corpo. Daniela \u00e9 t\u00e3o linda que tenho vontade de dizer: \u201cSeja feia\u2026\u201d<\/p>\n

Queremos percorrer as mulheres virtuais, visit\u00e1-las, mas, como conversar com elas? Com quem? Onde est\u00e3o elas? Tanta oferta sexual me angustia, me d\u00e1 a certeza de que nosso sexo \u00e9 programado por outros, por ind\u00fastrias masturbat\u00f3rias, nos provocando desejo para me vender satisfa\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

\u00c9 pela dificuldade de realizar esse sonho masculino que essas mo\u00e7as existem, realmente. Elas existem, para al\u00e9m do limbo gr\u00e1fico das revistas. O contato com elas revela meninas inseguras, ou doces, espertas ou bobas mas, se elas pudessem expressar seus reais desejos, n\u00e3o estariam nas revistas sexy, pois n\u00e3o h\u00e1 mercado para mulheres amando maridos, cozinhando felizes, aspirando por namoros ternos.<\/p>\n

Nas revistas, s\u00e3o t\u00e3o perfeitas que parecem dispensar parceiros, est\u00e3o t\u00e3o nuas que parecem namoradas de si mesmas. Mas, na verdade, elas querem amar e ser amadas, embora tenham de ralar nos har\u00e9ns virtuais inventados pelos machos.<\/p>\n

Elas t\u00eam de fingir que n\u00e3o s\u00e3o reais, pois ningu\u00e9m quer ser real hoje em dia \u2013 foi uma decep\u00e7\u00e3o quando a Tiazinha se revelou \u00f3tima dona de casa na Casa dos Artistas, limpando tudo numa faxina compulsiva.<\/p>\n

Infelizmente, \u00e9 imposs\u00edvel t\u00ea-las, porque, na tecnologia da gostosura, elas se artificializam cada vez mais, como carros de luxo se aperfei\u00e7oando a cada ano. A cada muta\u00e7\u00e3o er\u00f3tica, elas ficam mais inating\u00edveis no mundo real.<\/p>\n

Por isso, com a crise econ\u00f4mica, o grande sucesso s\u00e3o as meninas belas e saradas, enchendo os sites er\u00f3ticos da internet ou nas saunas relax for men, essa r\u00e9plica moderna dos har\u00e9ns \u00e1rabes. Essas lindas mulheres s\u00e3o pagas para n\u00e3o existir, pagas para serem um sonho impalp\u00e1vel, pagas para serem uma ilus\u00e3o.<\/p>\n

Vi um an\u00fancio de boneca infl\u00e1vel que sintetizava o desejo imposs\u00edvel do homem de mercado: ter mulheres que n\u00e3o existam\u2026 O an\u00fancio tinha o slogan em baixo: \u201cShe needs no food nor stupid conversation.\u201d Essa \u00e9 a utopia masculina: satisfa\u00e7\u00e3o plena sem sofrimento ou realidade.A democracia de massas, mesclada ao subdesenvolvimento cultural, parece \u201clibertar\u201d as mulheres. Ilus\u00e3o \u00e0 toa. A \u201cliberta\u00e7\u00e3o da mulher\u201d numa sociedade ignorante como a nossa deu nisso: superobjetos se pensando livres, mas aprisionadas numa exterioridade corporal que apenas esconde pobres meninas famintas de amor e dinheiro.<\/p>\n

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A liberdade de mercado produziu um estranho e falso \u201cmercado da liberdade\u201d. \u00c9 isso a\u00ed. E ao fechar este texto, me assalta a d\u00favida: estou sendo hip\u00f3crita e com inveja do erotismo do s\u00e9culo 21? Ser\u00e1 que fui apenas barrado do baile?<\/p>\n

Arnaldo Jabor<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Ficam penduradas em paus-de-arara e, depois, saem felizes com apenas um canteirinho de cabelos, como um jardinzinho estreito, a vereda indicativa de um desejo inofensivo e n\u00e3o mais as agressivas florestas que podem nos assustar. Parecem uns bigodinhos verticais que (oh, c\u00e9us!\u2026) me fazem pensar em\u2026 Hitler. Silicone, p\u00ealos dourados, bumbuns malhados, tudo para agradar […]<\/p>\n","protected":false},"author":24,"featured_media":130205,"comment_status":"open","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"_acf_changed":false,"footnotes":""},"categories":[7],"tags":[],"acf":[],"yoast_head":"\n