Após casos em SC, especialista explica aumento de ataques de pitbull em todo o país

Nos últimos dias, dois ataques de cães da raça American Pit Bull Terrier, conhecida como pitbull, repercutiram em Santa Catarina. No sábado (27), um homem de 38 anos morreu após ser atacado por quatro animais no quintal da casa onde prestava serviços, no bairro Ingleses, em Florianópolis. Oito dias antes, dois cães da raça fugiram de casa e deceparam a orelha de um cachorro vizinho, em Tijucas.

A repercussão dos casos no Estado vêm na esteira de outros ataques com cães da mesma raça no Brasil. No início do mês, a escritora Roseana Murray perdeu um braço e uma orelha após sofrer um ataque de três pitbulls em Saquarema, no Rio de Janeiro. Na mesma época, um cachorro atacou e matou o próprio tutor, que passava por uma crise epiléptica em Mogi Mirim, interior de São Paulo.

Dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) apontam que, no ano passado, 51 pessoas morreram no país após serem atacadas por cães, 27% a mais do que em 2022. Os números não são separados por raça, mas o médico veterinário Ricardo de Pauli, especialista em comportamento animal, diz que esse aumento caminha junto a uma popularização do pitbull, nos últimos anos.

— Os cães da raça Pitbull têm uma função não só de pet, mas também de guarda e proteção. As pessoas procuram um cão como uma forma de segurança, não só patrimonial, mas também muitas vezes para sair na rua sem medo de ser assaltado, ou violentado, no caso de mulheres — explica.

O especialista frisa também que a população de cães têm aumentado nos últimos anos, o que se reflete no número de ataques. O levantamento Radar Pet 2023, realizado pela Comissão de Animais de Companhia do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal (Sidan), aponta um crescimento na proporção de cães por habitante: de 0,277, em 2019, para 0,299, em 2023.

Pitbulls são naturalmente mais agressivos?

Segundo o especialista, os pitbulls têm maior potencial de lesão, pois a raça foi criada no século 19 justamente para competir em rinhas. No entanto, o comportamento de um animal não é expresso somente por conta da carga genética.

Existem três principais pilares que definem o comportamento de um cachorro: a genética, as experiências de vida e o ambiente. Segundo o médico veterinário, a socialização do filhote entre os 30 e 90 dias de vida é fundamental para garantir um comportamento não-agressivo, na vida adulta.

— Se um animal tem contato com animais e pessoas nesse período inicial, ele tende a entender muito bem o comportamento de uma pessoa e de outros animais e consequentemente não desenvolve medo e agressividade. Por outro lado, se ele não é socializado, ele pode desenvolver mais medo e mais agressividade — diz Ricardo.

Além disso, o ambiente em que vive o animal também influencia seu comportamento. Um cão que recebe muitos estímulos e coisas para fazer tende a lidar melhor com o estresse do dia a dia. Já um animal que vive preso pode ter reações mais intensas.

— O Pitbull é uma raça que não é para qualquer um ter. Se um tutor não tem comando e domínio sobre o cão, ou se ele não tem tempo pra passear com esse animal, para gastar a energia dele e para educar e adestrar esse cão, ele não deve ter esse cão. Um animal desse porte é uma máquina de matar nas mãos erradas — pontua o médico veterinário.

Em caso de ataques, também conta o fenômeno do comportamento sincronizado, que ocorre quando um cachorro ataca e os outros repetem o comportamento. Isso pode ter sido um agravante nos casos recentes em Santa Catarina, onde mais de um cão estava envolvido nos ataques.

O que diz a legislação

Em Santa Catarina, a lei 14.204, sancionada em 2007, proíbe a criação e comercialização de pitbulls no Estado e limita a circulação de cães da raça apenas quando conduzidos por guias com enforcador e focinheira. Na prática, porém, isso não ocorre.

Segundo o especialista, há uma falta de fiscalização na criação desses animais:

— A responsabilidade desse animal deve ser não somente do tutor, mas daquele que vendeu esse animal e que criou esse animal. Porque é lá na criação que começa o período de socialização. Mas infelizmente a realidade hoje em dia é que tem muitos canis que só querem saber do dinheiro e desmamam o animal o quanto antes, não têm o cuidado de tentar socializar o animal.